Muito do que somos e fazemos ou deixamos de fazer vem das imagens e expectativas projetadas em nós na infância e adolescência. Sem perceber carregamos conceitos e valores que não fazem parte de nós, mas que continuam interferindo negativamente em nossa vida. Muitas vezes não compreendemos bem o porquê de uma angústia, de um complexo.

Falamos muito sobre amor. Mas além do amor, crianças precisam ser admiradas. Sem admiração, por mais amadas que sejam, elas não se desenvolvem plenamente.

Quando não somos o que a nossa família espera que nós sejamos, mesmo que ninguém fale com todas as letras, sentimos que estamos sendo reprovados e tal rejeição levamos para onde formos na fase adulta. E não importa o quão admirados sejamos por outras pessoas, a sensação de reprovação fica impressa na alma como um carimbo mortal.

Não é à toa que mulheres lindas por dentro e por fora, inteligentes, boas profissionais agem como meninas submissas nas relações amorosas. Não é à toa que homens bem sucedidos e interessantes se submetem a mulheres manipuladoras. Tais pessoas não se sentem boas o bastante para viverem uma relação plena de amor e compreensão.

Mas chega um momento em que precisamos nos descolar de tais imagens e nos impormos como seres adultos e individuais. Talvez, este, seja um dos processos mais complexos e dolorosos da vida: parar de se ver como aquilo que projetaram em nós. Mas tal atitude é essencial para entrarmos de fato na vida adulta, no sentido psicológico da palavra. Ser adulto vai muito além de pagar as próprias contas e construir uma carreira. Muitas pessoas casadas e com filhos ainda não são adultas.

Muitas vezes filhos, netos, sobrinhos viram redutos de projeções alheias, uma espécie de bode expiatório dos traumas e lacunas de outros membros da família. É importante detectar esta perda de energia que muitas vezes sentimos em reuniões familiares. Às vezes, é muito mais simples se impor para o chefe ou para uma plateia lotada do que para os parentes numa festa de Natal.

Imagens impostas na primeira fase da vida nos ancoram emocionalmente num passado mal resolvido. É preciso refletir e aprender a distinguir o que parte de você e o que é mera projeção que jogaram em seus ombros.

 

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Escrito por Sílvia Marques – Via Obvious

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Silvia Marques
Viciada em café, chocolate, vinho barato, filmes bizarros e pessoas profundas. Escritora compulsiva, atriz por vício, professora com alma de estudante. O mundo é o meu palco e minha sala de aula , meu laboratório maluco. Degusto novos conhecimentos e degluto vinhos que me deixam insuportavelmente lúcida. Apaixonada por artes em geral, filosofia , psicanálise e tudo que faz a pele da alma se rasgar. Doutora em Comunicação e Semiótica e autora de 7 livros. Entre eles estão "Como fazer uma tese?" ( Editora Avercamp) , "O cinema da paixão: Cultura espanhola nas telas" e "Sociologia da Educação" ( Editora LTC) indicado ao prêmio Jabuti 2013.

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