Uma mulher transgênero, de 29 anos, que afirma ter sofrido transfobia em um restaurante em Santos, no litoral de São Paulo, deverá ser indenizada em R$ 30 mil por danos morais.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decidiu pela condenação em 2ª instância. A sentença foi assinada em fevereiro, pouco mais de um ano após o caso, denunciado em 2022. O termo “transgênero” ou “trans” se refere a uma pessoa cuja identidade de gênero não corresponde à do sexo de nascimento.

A defesa do estabelecimento negou as acusações e disse que vai recorrer à decisão. Segundo o advogado Reginaldo Mascarenhas, não houve transfobia e “inexistiu o impedimento dela usar o banheiro”.

A nutricionista e cabeleireira Julie Correia Araujo contou, em entrevista à época dos fatos, que foi vítima de transfobia ao perguntar sobre o banheiro feminino da lanchonete.

O estabelecimento fica na Avenida Conselheiro Nébias, no bairro Boqueirão. Segundo ela, um funcionário teria apontado para o sanitário masculino e dito que ela teria que usá-lo, pois era um “homem”.

A vítima registrou um Boletim de Ocorrência (BO), e o caso foi levado à Justiça. Em setembro de 2022, a 2ª Vara do Juizado Especial Cível de Santos julgou a ação como improcedente [sem fundamento], alegando que Julie “jamais foi impedida de usar o banheiro feminino” e que “tudo não passou de um grande mal-entendido”.

A defesa de Julie enviou um pedido de recurso que foi analisado e julgado pela 3ª Turma Cível do Colégio Recursal de Santos em fevereiro de 2023. Os juízes Orlando Gonçalves de Castro Neto, Renata Sanchez Guidugli Gusmão e Frederico dos Santos Messias condenaram a lanchonete a pagar R$ 30 mil por danos morais por transfobia.

Direitos autorais: Arquivo pessoal

“As pessoas trans […] estão amparadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana e são titulares dos direitos da personalidade. A identidade de gênero é uma escolha pessoal. À sociedade, resta a função de romper com o paradigma [padrão] da patologia estruturada sob a doutrina binária [feminino ou masculino] e transmutar-se [mudar] para o plano de construções de identidade de gênero por meio da cultura e do meio social […] e permitir ao sujeito expor o seu ser, externar suas escolhas e desejos, sem o receio de ser excluído, discriminado ou violentado”, ressaltou o juiz relator Castro Neto.

O advogado Reginaldo Mascarenhas, que defende o estabelecimento, afirmou que “inexistiu transfobia” e que irá recorrer da decisão. O profissional acrescentou que os magistrados teriam julgado uma afirmação que saiu na mídia, comparando a mulher a um “ladrão”.

“A decisão de segunda instância foi fundamentada em matéria de jornal que atesta a fala do dono [da lanchonete] que nunca aconteceu e não em produção de prova. A suposta fala em jornal nunca existiu, não sabemos de onde tiraram isso”, disse o advogado.

Ele continuou: “O juiz de segunda instância se apega a essa suposta fala dizendo que no jornal o dono equipara ela a um ladrão, e isso, além de não ter acontecido, não faz parte do reclamo. Inclusive, inexistiu o impedimento dela usar o banheiro, por isso o juiz de primeira instância foi tão certo na decisão.”

Relembre o caso

A nutricionista e cabeleireira relatou à época que voltava da praia com familiares e amigos, quando decidiram parar para almoçar no estabelecimento. Em determinado momento, os primos dela foram até o caixa para acertar a conta, e Julie procurou por um banheiro, abordando um dos funcionários para pedir a informação.

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“Eu dei boa tarde e perguntei onde ficava o banheiro feminino. Aí, ele falou assim para mim: ‘Você não pode usar o banheiro feminino, porque você é homem.’ Sabe quando você não está esperando? Porque eu simplesmente perguntei onde era o banheiro. Poderia ser para mim ou para qualquer outra pessoa. Eu não falei que era eu quem ia usar o banheiro“, explicou.

Irritada, ela conta que chegou a xingá-lo de “babaca”, e se dirigiu ao caixa para perguntar sobre o gerente. Contudo, ouviu mais uma vez que não poderia usar o toalete feminino. “Me disseram que era proibido. Você é homem. Ou seja, ele reiterou aquilo que o funcionário tinha falado.”

Após insistir, Julie conseguiu usar o banheiro feminino naquele mesmo dia.

Após o episódio, a cabeleireira se posicionou em uma página que administra nas redes sociais e fez uma denúncia de transfobia no 7º Distrito Policial (DP) de Santos.

Se você presenciar um episódio de LGBTFobia denuncie o quanto antes através do número 100, que está disponível todos os dias, em qualquer horário, seja através de ligação ou dos aplicativos WhatsApp e Telegram.

O mesmo número também atende denúncias sobre pessoas idosas, crianças e adolescentes, pessoas com deficiência, pessoas em restrição de liberdade, mulheres e população em situação de rua. Além de denúncias de discriminação étnica ou racial e violência contra ciganos, quilombolas, indígenas e outras comunidades tradicionais.

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O Amor - Redação
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