Criado por Bert Hellinger, a constelação familiar é uma prática que visa colocar o sujeito dentro de uma dinâmica para explorar eventuais conflitos pessoais.
No entanto, ela é bastante controversa. Além de não ser reconhecida sequer pelo Conselho Federal de Psicologia, muito menos pelo Conselho Federal de Medicina, ela vem sido amplamente trabalhada em grupos terapêuticos.
A ideia da constelação familiar é trabalhar questões mal resolvidas e até mágoas entre familiares, que continuam gerando sofrimento para a pessoa. Acredita-se que essas questões não resolvidas possam até afetar os relacionamentos vindouros. Aí onde a constelação familiar trabalharia, já que propõe ser uma técnica benéfica, rápida e eficiente.
Em uma primeira instância, sim é necessário resolver problemas familiares. Dentro dessa técnica faz-se uso do psicodrama, que dramatiza situações que a pessoa teria vivido em algum momento, como também da psicoterapia leve. De acordo com o Viva Bem do portal UOL, ambas práticas, ainda que sejam parecidas, não são reconhecidas pelo Conselho Federal de Psicologia.
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A técnica é subjetiva e empírica, ou seja, não possui comprovação científica. Por essa situação, inúmeros especialistas e profissionais da área de saúde consideram como um equívoco chamar a constelação familiar de terapia.
Como funciona a sessão de constelação familiar
Geralmente, a pessoa passará por algumas dramatizações que têm como finalidade trazer à tona sentimentos e sensações represas. Existem sessões grupais onde os participantes ajudam na encenação.
Quando são feitas sessões individuais, a pessoa pode usar bonecos ou qualquer outro recurso disponível no momento para identificar os atores dentro daquela dinâmica.
Nessas sessões são recriados os problemas. Existe um mediador que é o encarregado de interpretar a representação, para assim, chegar à conclusão ou solução do conflito. Não há um tempo médio ou limite, podendo as sessões variar entre 5 minutos e chegando até a 1 hora ou mais.
No livro “Constelações Familiares – O Reconhecimento das Ordens do Amor”, de Hellinger, o autor e criador da constelação familiar explica que uma vez que o constelado – pessoa que passará pelo processo – comentar seu problema com o mediador, a sessão começa.
Cada voluntário ou participante pode atuar de acordo com a situação exposta, que pode ser desde a integração de alguém que foi excluído da família ou qualquer outro tema que cause ou gere algum tipo de conflito para o constelado.
De acordo com o site Minha Vida, à medida que a prática avança, as pessoas passam a ser guiadas “pela energia do campo morfogenético”.
É parte do mediador tentar validar hipóteses ou identificar a situação inicial que desencadeou tal conflito ou problema na vida do constelado, dentro daquele sistema familiar. Cada situação tem seu desfecho.
Críticas à constelação familiar
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Em nota emitida pelo Conselho Federal de Psicologia, de maio deste ano (2023), o órgão destaca as incongruências da prática, tanto no campo ético quanto no campo da conduta profissional do uso dessa prática.
Também o conselho pontua que essas sessões são realizadas de maneira pública, com a participação de outras pessoas, algo que é incompatível com o sigilo profissional, disposto no Código de Ética da Psicologia.
Para outros profissionais que estudam o uso da constelação familiar no serviço público, a prática termina reforçando papéis de gênero e vão contra os avanços conquistados no campo do direito da família.
Em entrevista ao Deutsche Welle, o sociólogo Mateus França explica que a prática também ignora as ciências sociais, além da reprodução de violência de gênero, já que ela trabalha do pressuposto de que pessoas violentas não podem ser excluídas do sistema familiar.
“Coloca a culpa do conflito na mulher. São afirmações muito perigosas, de por exemplo não excluída da família o homem que a agrediu ou então que um feto abortado falta na hierarquia da família por ter sido excluído”, explica.
Referente aos campos morfogenéticos, o professor de física Marcelo Takeshi, da Universidade Estadual de São Paulo, aclara que esses fenômenos nunca foram comprovados. “Não tem nenhum respaldo na física, nem respaldo em experimentos científicos. É algo inventado, nunca teve nenhum indício de comprovação dessa hipótese”.
Para o professor, a constelação familiar atende aos requisitos para ser uma pseudociência: tem um autor que criou o tema para justificar a prática, além de se resistir a expor a prática a testes.
Constelação familiar no judiciário
Além de ser prática integrada no Sistema Único de Saúde, desde 2015 a constelação familiar vem sido usada como método alternativo para resolução de conflitos, principalmente nas audiências de mediação e reconciliação.
Dentro do Direito já é possível observar o uso da constelação familiar no Direito Familiar. Nela, a mulher também é vista como inferior ao homem, pela lei da hierarquia, o que aumenta ainda mais a vulnerabilidade das mulheres perante os processos judiciários, além de violar o princípio básico do Direito: o da isonomia.
Entrevistado pelo site Conjur, o advogado Francisco Campis explica que existem situações onde as dinâmicas tendem a naturalizar a violência sexual sofrida pelas meninas, ainda que seja dentro do núcleo familiar, isentando a responsabilidade do homem em caso de violência sexual.
Ainda há casos onde a prática é imposta às partes, contrariando a própria natureza da mediação dentro do Judiciário.
Quem defende a constelação familiar
Existem psicólogos que são favoráveis a essa prática, afirmando que ainda que faltem estudos comprobatórios para atestar a eficácia da constelação familiar, eles conseguem verificar resultados positivos nos pacientes, já que eles conseguem resolver seus conflitos na sessão, além de superarem traumas de maneira rápida.
Acredita-se que essa prática permita identificar a causa de conflitos que cada pessoa possa ter experimentado no âmbito familiar, profissional, relacionamentos e até na saúde.
Quem foi Bert Hellinger, criador da constelação familiar
Bert Hellinger. Direitos Autorais: Reprodução/Wikimedia Commons/CeStu
Proposto pelo missionário católico alemão Bert Hellinger em 1978, a constelação familiar une referências oriundas da psicologia com seus trabalhos de 16 anos com os zulus da África do Sul, além de revisões de leituras taoístas.
Hellinger considerava que os conflitos estavam ligados a uma questão de ancestralidade e que eles poderiam se manifestar através das gerações.
Entre os ensinamentos mais polêmicos está que as crianças que são vítimas de incesto devem ter compreensão para com o agressor e aceitarem o contato sexual. “A solução para a criança é que a criança diga para a mãe: ‘Mamãe, por ti, eu o faço com prazer’, e para o pai: ‘Papai, pela mamãe, eu o faço com prazer’”, “explica” Hellinger.
Além das posturas polêmicas, Hellinger já foi acusado na Alemanha de ter relativizado o nazismo. Ele teria publicado um livro de poemas dedicados a Adolf Hitler, onde ele pedia ao leitor que se identificasse com o líder nazista.
A constelação familiar pode substituir a terapia?
Não. Ela não substitui a terapia convencional, como também não dispensa o uso de medicamentos e do devido tratamento psiquiátrico, caso seja necessário para complementar a abordagem médica.
Por ter uma aplicação abrangente, toda sorte de conflitos é levada a essas sessões. Nelas, a pessoa consegue entender que vem repetindo padrões de seus antepassados, ainda que ela nunca os tenha conhecido em vida.
Pode soar como uma “maldição”, mas, segundo os estudos de Hellinger, os descendentes terminam repetindo esses mesmos padrões, ainda que inconscientemente, através das gerações.
Qualquer pessoa pode fazer a constelação familiar?
As pessoas que aplicam esse tipo de prática desaconselham que quem esteja passando por momentos de depressões severas, estejam emocionalmente frágeis ou em outras situações mais delicadas, não atendam às sessões.
Pessoas com quadros psicopatológicos comprovados, que estejam em crise ou pré-crise, vítimas de traumas profundos ou sob efeito de drogas ou álcool também não devem fazer constelação familiar.
Crianças somente podem participar com a devida autorização dos pais. Hellinger, em seus estudos, sugeriu que uma criança acima de 8 anos já tem consciência plena para poder vivenciar uma sessão.
*Nota: As informações e sugestões contidas neste artigo têm caráter meramente informativo. Elas não substituem o aconselhamento e acompanhamentos de médicos, nutricionistas, psicólogos, profissionais de educação física e outros especialistas.
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