No Brasil nascem por ano 2,8 milhões de bebês e, considerando que ser mãe de um é diferente de ser mãe de dois, de três ou de quatro, podemos dizer que nascem também 2,8 milhões de mães. Mas hoje, mais do que em qualquer momento da história, é possível dizer que a maternidade mudou.
Em tempos de contestação e desconstrução de padrões, não são poucas as mulheres que começam a repensar a forma que vão exercer a criação de um filho. Neste dia das mães, conheça três dessas mãezonas que, por um futuro melhor, desafiam alguns dos padrões comuns, como a dieta, o conceito de lar e também as definições do que é de menino e de menina.
Filho de vestido, pode?
A primeira vez que o Chico, de oito anos, pediu para usar um vestido, a jornalista Carol Patrocínio, 34, se fez de desentendida e deu um camisetão no lugar. “Tinha medo do que as pessoas iam pensar dele. Foi um processo até eu entender que não fazia sentido eu não respeitar meu próprio filho”.
A mãe sempre se esforçou para criar tanto o mais novo como Luca, 15 anos, sem reforçar papéis de gênero, mas o que pode parecer simples não acontece sem uma dose extra de julgamentos, especialmente quando um dos filhos resolve que vai mesmo desafiar tudo e todos.
Chico já foi apontado na rua, julgado por adultos, ofendido nas redes sociais e tratado como menina, mesmo se apresentando como menino. O motivo? Naquele dia, trocou o moletom pelo vestido ou o boné pelos longos cabelos solto.
Carol Patrocínio e Chico – Direitos autorais: Reprodução/Instagram
“Posso ser uma mãe incrível não fazendo o que esperam que eu faça como mãe”, comenta a jornalista, que tem o diálogo e o respeito como base da pedagogia que desenvolve em casa, onde toda pequena decisão é conversada, debatida e decidida em conjunto. “A maternidade não é só a gente ir lá e indicar o caminho, é a gente encontrar junto o caminho”.
Tanta flexibilidade trouxe dificuldade para muitos, até mesmo amigos e familiares, lidarem com as escolhas de Chico, mas a mãe garante que no final das contas, entre se afastar e conviver com o pequeno, todos escolhem a segunda opção – e faz questão de lembrar que também há muitos momentos inspiradores nessa jornada.
O maior deles, talvez, tenha sido o retorno que recebeu ao compartilhar sua história nas redes. Neste momento, entre críticas e haters, muitas mães vieram agradecê-la, pois descobriram que não estavam sozinhas. “São mães que descobriram que um gosto não quer dizer nada. Não quer dizer que a criança vai ser gay, que a criança vai ser trans. Só quer dizer que ela está descobrindo o mundo e essa é a forma dela de descobrir”.
Vegana de berço
“Vendo de longe, ninguém vai dizer que somos veganos”, garante a empresária Monica Buava, 33, mãe de Marina, de três anos. Empresária, dona de restaurante e ativista, ela é vegetariana há 17 anos, dos quais 15 têm passado sem comer absolutamente nada de origem animal – e sua filha a acompanha.
Como voluntária da Sociedade Vegetariana Brasileira, a paulistana sabia que a dieta vegana poderia ser saudável e a seguiu, da gravidez à introdução alimentar da filha. “O veganismo é um valor, uma opção de vida minha e do meu marido, não faria sentido a gente não passar isso para ela”, explica.
Monica e a filha, Marina, seguem um estilo de vida vegano – Direitos autorais: Arquivo Pessoal
Com acompanhamento de um nutricionista e um obstetra, que respeitou suas escolhas, Marina disse que só teve uma dificuldade, no hospital. “Mesmo a gente explicando, pedindo, não teve um dia que acertaram minha dieta”, conta a mãe, sem deixar de dar um crédito a instituição: “Marina só precisou de leite materno, mas ao menos, se fosse o caso, eles tinham fórmula vegana”.
No começo, Marina apenas seguia a alimentação que conhecia, plant based, claro. A primeira conversa veio há pouco tempo, por causa de uma pipoca. “Ela adora pipoca, e a gente sai bastante com ela para passear na rua, mas às vezes os pipoqueiros colocam bacon ou manteiga, e aí tivemos que explicar porque não comer daquela vez”, conta a mãe.
“Ela tem três anos e isso pode mudar, mas a gente espera e trabalha para que não. Para nós, [ela dizer que quer comer carne] é como dizer que quer roubar alguma coisa. O valor de não machucar, não maltratar o outro é muito importante para gente”, explica Monica, que não sabe como reagiria se a filha optasse por não ser vegana. “Não sei o que faria. O que você vai fazer se seu filho for racista? Homofóbico?”
Infância globalizada
Sociabilidade, liberdade e respeito pelo mundo. Para Allyson Natier, 28 anos, estes são apenas alguns dos valores que a estrada ensinou a Ella, 4 anos, Noam, 3, e Adèle, 15 meses. Casada com um brasileiro, a blogueira e nômade digital nascida na França não parou de rodar o mundo em em nenhuma gravidez. “Costumamos pensar assim: onde há crianças e bebês, podemos viajar”, diz.
A máxima passou a fazer sentido após uma viagem de três semanas para o Peru. Allyson estava grávida e o casal havia cancelado os planos de volta ao mundo por isso, mas logo percebeu que aquele não era um empecilho tão grande assim. “Com essa viagem vimos que era totalmente possível. A Ella nasceu e, em seguida começamos desbravar o mundo”, relembra.
Alysson cria os filhos na estrada e não vê problema algum nisso – Direitos autorais: Arquivo Pessoal
A jornada deles passou por 17 países em um ano. Na segunda gravidez, viajaram durante 5 meses pela Ásia e só voltaram a Paris quatro semanas antes do parto. Já na terceira, as peregrinações foram até a 37ª semana.
“Durante 3 anos nossos filhos não sabiam o que era ter muitos brinquedos, um quarto próprio ou ir para escola, e não sentiam falta. Pelo contrário, quando estávamos em um lugar, eles logo pediam para voltar para o avião e ir viajar”, garante Allyson.
Uma fluidez que é vista por alguns como falta de estabilidade, mas não por ela. “As pessoas sempre perguntam se a gente não pensa em parar, garantir uma vida social para nossos filhos. Mas eles tem uma vida super social, sempre conhecendo novas pessoas, culturas e idiomas”, explica.
Hoje, a família está em São Paulo, curtindo pela primeira vez uma parada mais longa, O motivo? Precisam investir no crescimento de um novo negócio. Mas não pense que eles desistiram: serão dois anos, depois pé na estrada! Com paradas planejadas no México, ou quem sabe um pulinho em Bali.