A médica recém-formada Alicia Dudy Muller Veiga, que foi sentenciada a cinco anos de prisão por desviar fundos da festa de formatura de sua turma de Medicina na Universidade de São Paulo (USP), conseguiu obter seu registro profissional no Conselho Federal de Medicina (CFM).
A defesa de Alicia declarou em uma nota que ela não deve ser submetida a um “linchamento público contínuo” e enfatizou a importância do “direito ao esquecimento”.
Eles também argumentaram que a “insistência na divulgação de informações antigas” impede “a reintegração social”.
No site do CFM, seu registro é listado como “inscrito” desde 26 de dezembro de 2024 e em situação “regular”, sob o número de CRM 267045-SP. Não há menção a qualquer especialidade.
O Estadão entrou em contato com a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo para saber o status atual da pena da médica, mas ainda não recebeu uma resposta.
Alicia foi acusada de desviar R$ 927 mil da formatura dos estudantes da Faculdade de Medicina no início de 2023.
Ela foi condenada pelo crime de estelionato, com uma pena de cinco anos em regime semiaberto, além de uma indenização às vítimas correspondente ao prejuízo causado, em julho de 2024.
O advogado Sergio Ricardo Stocco Giolo, que defendeu Alicia durante o processo, afirmou na época da condenação que ela não cometeu o crime de estelionato. Segundo Giolo, sua cliente apresentou provas que comprovam sua inocência e, por isso, eles planejavam recorrer da decisão judicial.
A médica também é alvo de outra investigação, de julho de 2022, sob suspeita de lavagem de dinheiro e estelionato após supostamente aplicar um golpe em uma casa lotérica.
Ela teria gasto mais de R$ 400 mil em apostas durante esse período, mas na última vez que tentou fazer uma aposta, teria deixado de pagar R$ 192 mil ao estabelecimento. Este caso ainda está pendente de julgamento.
A Polícia Civil suspeita que o dinheiro usado nas apostas seria o mesmo desviado da comissão de formatura.
Relembre o caso
O caso veio à luz no início de 2023, quando estudantes de Medicina da USP registraram uma ocorrência contra a colega de turma.
As investigações revelaram que Alicia, que era a presidente da comissão de formatura, estava usando o dinheiro arrecadado para a festa para seu próprio benefício, comprando celulares, relógios, alugando carros e pagando aluguel de apartamento.
A polícia notou a melhora do padrão de vida da jovem em um curto período de tempo e a acusação por estelionato contra Alicia foi feita pelo Ministério Público em março de 2023.
A acusação, assinada na época pelo promotor Fabiano Pavan Severiano, afirma que Alicia cometeu estelionato oito vezes e tentou uma nona vez, que não foi bem-sucedida.
O número de crimes cometidos por Alicia se refere ao número de vezes que ela teria solicitado à empresa contratada para organizar a festa que transferisse o dinheiro da conta bancária da comissão para sua conta pessoal.
Essas transferências teriam começado em novembro de 2021 e continuado ao longo de 2022 em outras sete ocasiões. Os oito pedidos totalizaram a transferência de R$ 927.765,33 para as contas de Alicia.
Ela teria tentado uma nova transferência em janeiro de 2023, mas a empresa, já alertada sobre a situação pelos colegas de turma, não realizou o que seria o nono repasse.
Ainda em janeiro de 2023, Alicia confessou aos colegas de turma que havia perdido o dinheiro arrecadado pela comissão. Primeiro, ela disse que havia investido o dinheiro e sido vítima de um golpe por uma empresa de investimentos.
Dias depois, após o caso se tornar público e os colegas registrarem uma ocorrência, ela admitiu em depoimento à Polícia Civil que usou os fundos da formatura para despesas pessoais e apostas em casas lotéricas na tentativa fracassada de recuperar o dinheiro perdido.
O juiz Eduardo Balbone Costa, da 7ª Vara Criminal da Capital, que assina a decisão por estelionato contra os colegas de turma, afirma que Alicia se aproveitou de sua posição como presidente da comissão de formatura “para engendrar um plano” para se apropriar do dinheiro arrecadado ao longo de meses “a fim de obter lucro para si com a aplicação especulativa daquele capital”.
Em nota, a defesa de Alicia afirmou na época que recorreria da decisão por entender que ela não cometeu o crime de estelionato.
“Entendemos que a respeitável decisão desconsiderou as provas de inocência apresentadas pela defesa de Alicia, como o exame dos depoimentos prestados no curso da ação penal; das inúmeras mensagens eletrônicas trocadas entre os membros da comissão de formatura; e pelo cerceamento de defesa em razão do juízo não ter permitido a realização de prova tempestivamente requerida”, afirmou Giolo na ocasião.
O Ministério Público de São Paulo também acusa Alicia por suspeita de lavagem de dinheiro e estelionato em relação às apostas que ela fez em uma casa lotérica na zona sul de São Paulo.
De acordo com o depoimento do gerente da lotérica, Alicia teria prometido fazer o pagamento das apostas por meio de transferência PIX. O valor das apostas seria de R$ 193,8 mil, mas o gerente percebeu depois que Alicia havia apenas agendado a quantia, e não efetuado o pagamento.